terça-feira, 23 de novembro de 2010

Um passo

Na década de 30, falar de exclusão social era blasfémia, então, eis que surge um grupo de intelectuais determinados em lutar pela ruptura do sistema, para a justiça social e para a liberdade do homem. Os claridosos.

Leia-se um dos poemas de Osvaldo Alcântara (pseudónimo de Baltazar Lopes da Silva), um dos responsáveis pelo movimento Claridade.

Passaporte para Pasárgada

«Pasárgada não é lugar a comum.

Lá quem manda é o Rei,

que é amigo dos horizontes

e ouve as cantigas que os meninos cantam

na Rua Direita e na Rua do Sol»

«Quem tenha ouvidos e oiça, que vá.

Os surdos não entram em Pasárgada

Os surdos, entrego-os na misericórdia de Cristo,

que os há-de aperfeiçoar para a próxima reincarnação

Nesta não entram em Pasárgada.»

«Oh! Rei! Pela tua magnificência,

Concede mãos aos homens

para poderem ser cidadãos de Pasárgada…»

Extrato do poema «Passporte para Pasárgada» da obra "Cântico da Manhã Futura"

de Osvaldo Alcântara,

Este foi e é o nosso país…

A distância temporal dos anos 30 para o presente é apenas uma ilusão!

O inimigo é sempre o mesmo e não dorme, é omnipresente.

A construção do nosso país não está apenas nas mãos de meia dúzia de pessoas como nos querem fazer acreditar!

Sua Excia daqui e Sr. Ministro dacolá...O nosso vocabulário tem mais do que isso!!!

Tem também o senhor. Fulano, menina Beltrana, senhora Sicrana..

Atenção: Somos mais!! E cada um com a sua ciênca. Somos um só, somos o poder.

É preciso incluir a palavra Humildade no nosso quotidiano para podermos acreditar em nós mesmos e nos outros! Se ficarmos nesse ciclo vivioso do "o que fizeres hoje, eu destruirei amanhã quando estiver no poder" vai ser o fim, porque, assim esgotaremos os recursos, e a nossa sociedade entrará em descalabro, assim como acotece com o o equilíbrio da Natureza quando sucede o abuso dos recursos naturais.

Vamos rasgar as palavras de grandeza, não queremos ser grandes, queremos apenas existir com dignidade! Se escolhermos ficar grandes e vazios, podemos morrer de fome. Não somos balões!

Tenhamos em atenção ao nosso património natural e cultural porque eles existem e apresentam-se ao alcance dos nossos sentidos, e somos suficientemente racionais para cuidar dele, não somos animais irracionais!!

Os nossos antepassados ensinaram-nos a lutar pela justiça social para um Cabo Verde melhor.

Sim é difícil tirar os olhos do chão porque temos que trabalhar a “terra”, ok. Temos que criar os nossos filhos ok. Mas é exactamente por isso, para fazermos melhor é preciso olhar para o geral para compreendermos o particular e avançar. Ás vezes é preciso darmos um passo para trás para podermos continuar a jornada.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Awake

Dedicado a Cordá Monte Cara
AWAKE

Shake dreams from your hair
My pretty child, my sweet one.
Choose the day and choose the sign of your day
The day's divinity
First thing you see.

A vast radiant beach in a cool jeweled moon
Couples naked race down by it's quiet side
And we laugh like soft, mad children
Smug in the wooly cotton brains of infancy
The music and voices are all around us.
Choose they croon the Ancient Ones
The time has come again
Choose now, they croon
Beneath the moon
Beside an ancient lake
Enter again the sweet forest
Enter the hot dream
Come with us
Everything is broken up and dances.

lyrics: the doors

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

On the turning away

Não mais virar as costas à frieza interna
Apenas um mundo que todos temos que compartilhar
Não é suficiente apenas ficar em pé e assistir
É apenas um sonho que não existirá mais
Virar as costas?

Extracto do poema
«On the turning away»
Pink Floyd

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Mais ou menos

Francisco Xavier




A gente pode morar numa casa mais ou menos, numa rua mais ou menos, numa cidade mais ou menos, e até ter um governo mais ou menos.

A gente pode dormir numa cama mais ou menos, comer um feijão mais ou menos, ter um transporte mais ou menos, e até ser obrigado a acreditar mais ou menos no futuro.

A gente pode olhar em volta e sentir que tudo está mais ou menos...

TUDO BEM!

O que a gente não pode mesmo, nunca, de jeito nenhum...
é amar mais ou menos, sonhar mais ou menos, ser amigo mais ou menos, namorar mais ou menos, ter fé mais ou menos, e acreditar mais ou menos.

Senão a gente corre o risco de se tornar uma pessoa mais ou menos.

Francisco Xavier

sábado, 30 de outubro de 2010

Azeite em água

Quando foi que nos deixamos esquecer os nossos prazeres? Quando?
Hey, vem dança, esquece...
E atónitos a observar o solo duma rua sem nome deixamo-nos quedar ao som de uma folha esvoaçante incrivelmente leve e voa, voa com vida... Quando...?
Não é nada, quando acordares tudo fica no lugar no lugar no lugar no lugar...
Esconde-te, deixa-te ficar, amanhã tudo se resolve...
E o quando volta a pairar....
Apanhamo-nos sóbrios completamente nus e pudicamente cumprimentamo-nos como se fosse o mais corriqueiro dos dias...
Munidos de olhos que nada distinguem a rua parece interminável... Quando?
Há paredes, e nelas, letras ilógicas vociferantes que ingenuamente escondem verdades invisíveis
Não sei se é dor se é sentimento se é outra coisa qualquer..
O quando insiste, é azeite em água...

domingo, 24 de outubro de 2010

O canto da sereia

Esse país
Manuel de Novas

Bem conchê êss Mindelo pikininu

Bem conchê sabura di nôs terra

Bem conchê êss paraíso di cretchêu

ki nôs poeta canta c' o amor

na sês verse imortal criol

Kem ca conchê Mindel, ca conchê Cabo Verde


Bem disfruta morabeza ness povo franco sem igual

Li nô ca tem riquéza, nô ca tem or nô ca tem diamante

Ma no tem êss paz di Deus

ki na mundo ca tem

e êss clima sab ki Deus dano, bem conchê êss país


Manuel de Novas
Fotografia: Nick Brandt

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A memória do esquecimento


Quem se lembra que em 1917 foi criado o Museu Caboverdeano em São Vicente?

Para aqueles que não se lembram, um refresh:


« (…) Usando da autorização concedida ao Govêrno pelo artigo 87º da Constituição Política da República Portuguesa;

Hei por bem, sob proposta do Ministro das Colónias, decretar o seguinte:

Artigo 1.º É criado na cidade de Mindêlo, um museu provincial, denominado «Museu Caboverdeano», que funcionará sob a direcção da Secretaria geral do Governo da província.” “ (…) Ministério das Colónias, 28 de Setembro de 1917 – O ministro das Colónias, Ernesto Jardim de Vilhena» *


A tabela integrante do mesmo decreto publica uma primeira secção dedicada ao pessoal, que era constituído por um conservador com vencimento de categoria e vencimento de exercício (792$00 no total), um escriturário com vencimento de exercício (216$00), os serventuários com vencimentos de exercício a 40$00 diários, uma segunda secção dedicada ao material «para despesas de material, conservação e outras, etc.» (1200$00). **


Note-se a fineza da criação deste decreto; outros tempos, outros sistemas, outras políticas, outros interesses…

Se fosse num sistema de orelhas moucas e numa política de terra queimada como se verifica nos nossos tempos (do tipo: abaixo o trabalho do outro!), como seria caracterizado e valorizado o trabalho daquele conservador de 1917?


De que modo os cordelinhos mágicos esculpiriam o relatório para uma memória colectiva à maneira? Questões corriqueiras.

Não se perde nada em perguntar: Em que políticas se enquadram as decisões sobre o que valorizar? Que lógica decide o que deve ficar na nossa memória colectiva?


Porém, algumas certezas descansam serenamente nos corações dos habitantes das ilhas cabo-verdianas: Não existe disputa; “Ninguém” contestará a favor de coisa nenhuma; A História descreverá o processo, e não o homem. Estas rochas gravam todos os ecos; Nós somos meras peças do Xadrez dos Deuses…


Para terminar este pequeno texto, uma citação de Khalil Gibran: «Que pensar do boi que gosta do seu jugo e julga que o gamo e o alce da floresta são coisas perdidas e vagabundas? Que pensar da velha serpente que não é capaz de deitar fora a pele e qualifica todas as outras de nuas e despudoradas? Que direi destes, a não ser que também eles estão na luz mas de costas viradas ao Sol? Vêem apenas as suas sombras, e as suas sombras são as suas leis. E que é reconhecer as leis senão inclinar-se e traçar as próprias sombras na terra? (...)» (Extracto do poema: «As Leis», da obra O Profeta do autor Khalil Gibran)



* Decreto nº 3.406, publicado no suplemento nº 18 do Boletim Oficial nº 43 de 1917


** idem

sábado, 16 de outubro de 2010

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Caboverdianamente

Caboverdianamente


Detém-te lágrima

Não ferimos ainda o último combate

Ah este desejar loucamente o sol

este ansiar febril por fonte que não há



Detém-te e espera

caboverdianamente espera

o dia em que

devagarinho

penetrarás

a terra seminada de esperança



Detém-te lágrima

que estás no limiar do reino encharcado de ol

do belo reino encharcadode sol

a razão crioula da nossa luta



Detém-te e olha

as palavras feitas raizes

entrelaçadas de amor

e sangue

confundidas na mesma seiva

que alimenta montes e sargaços



Detém-te lágrima

e aguarda

calmamente aguarda

caboverdianamente..







Um dos cem poemas de Ovídio Martins, extraído da obra "Gritarei, berrarei, matarei, não vou para Pasárgada" 1962




Como diz o senso comum: "A História, repete-se a si mesma". Citar Ovídio Martins e este poema em particular é falar do caboverdiano como um ser humano que ainda está a trabalhar a Liberdade de "poder"trabalhar, de "poder" suprir as necessidades daquilo que faz falta, de "poder" ser e de "poder" fazer. O poema é de 1962 mas é mais ainda de 2010. Porque somos cabo-verdianamente aquele que se constrói buscando o desenvolvimento através da liberdade de Ser.




O desenvolvimento não é um corpo belo esguio mas sem mãos, o desenvolvimento é um corpo completo proporcional, alcançá-lo é ainda quase uma utopia, e quando alcançado será então algo duro de manter..

sábado, 18 de setembro de 2010

A mentira da verdade

La mentira

composição: Manu Chao

mentira lo que dice
mentira lo que da
mentira lo que hace
mentira lo que va
(la mentira….)

mentira la mentira
mentira la verdad
mentira lo que cuece
bajo la oscuridad

(mentira, mentira, la mentira…)

mentira el amor
mentira el sabor
mentira la que manda
mentira comanda
(mentira, mentira, la mentira…)

mentira la tristeza
cuando empieza
mentira no se va

(mentira, mentira, la mentira…)

mentira no se borra
mentira no se olvida
mentira, la mentira

mentira cuando llega
mentira nunca se va

mentira la mentira
mentira la verdad...

todo es mentira en este mundo
todo es mentira la verdad
todo es mentira yo me digo
todo es mentira ¿por que sera?


(mentira, mentira, la mentira…)

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Tradicional Art Museum is dead..finally

Uma nova reencarnação vai ter lugar, talvez na próxima lua cheia. Tcham tcham tcham

Nós as poeiras do local, limitar-nos-emos a vaguear como sempre ao sabor dos ventos de hélices dos pássaros poisantes. Ora num canto ora noutro, conforme a prescrição e o devaneio. Lá (overthere- leia-se ouvadé) os pássaros de carne e osso sobem para o escalão de pássaro de ferro. Aqui as poeiras devem continuar poeiras, só assim poderão facilmente ser varridos de canto em canto.

Você que aprecia ritos de possessão espírita, não perca!!
A função terá lugar num terreiro perto de si!!
see ya

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O abuso de poder em Cabo Verde

Por vezes somos impelidos a criticar a gestão de determinadas instituições estatais. A vontade legítima de mudar algo leva-nos a elaborar críticas apaixonadas e destrutivas sobre a gestão de beltrano, críticas essas, por vezes, até injustas. Mas se acompanharmos atentamente o percurso das coisas, podemos observar que entra gestor, sai gestor, entra ministro sai ministro as críticas continuam sendo as mesmas. Logo, concluímos que afinal o sistema está traçado com linhas diferentes daquelas que usamos para desenhar o entendimento sobre como funcionam essas instituições.

Constatamos à vista desarmada que existe uma falha de comunicação entre os sucessivos governos e a sociedade civil relativamente à divulgação de projectos. Ou será que a própria composição das maquinarias governamentais é incompatível com a participação da sociedade civil na construção das próprias políticas públicas?

O Doutor Onésimo Silveira afirma que "É preciso que as regiões sejam dotadas de poder de decisão para poderem participar realmente no desenvolvimento do país. Quem está a participar no desenvolvimento do país são os partidos políticos através da Assembleia Nacional, as regiões não. E elas têm que ter um papel dinâmico na solução dos problemas políticos, de desemprego etc" (Jornal A Semana 21 de Maio de 2010)

As histórias chegam confundir-se de tão repetitivas e semelhantes. Ou não há verba para projectos locais, ou porque a Praia não dá feedback às correspondências enviadas e por aí adiante.

Os ministérios nomeiam seus representantes em cada concelho não para serem mediadores entre o local e a capital, mas para serem executores das directivas do poder central. As agendas políticas estão longe de permitir a autonomia dos órgãos locais, isto é, não se pretende melhorar o desempenho de cada repartição, a não ser através de palavras de fachada. Portanto os projectos e prioridades locais são completamente ignorados, prejudicando assim o desenvolvimento local.

Este nosso modelo de governação acarreta uma série de consequências desastrosas a nível humano, principalmente para as regiões com características urbanas acentuadas. O desemprego, o sub-emprego, os problemas sociais acrescidos, a violência doméstica, abandono escolar, a delinquência juvenil, vandalismo, entre outras.

Assim é o sistema, com tecnologia de ponta a nível de telecomandos adaptáveis à característica insular do país. Os políticos demagogos podem guardar os seus discursos paternalistas porque os locais estão conscientes que o progresso local constitui um empecilho para o abuso do poder e leva à descentralização do mesmo, ora isso, como todos podem constatar, não consta das agendas políticas dos governos.

Daqui a pouco, são as eleições legislativas, em jeito de celebração de uma ilusão e lá vamos nós obedientes exercer o dever cívico de votar, melhor dizendo, alimentar a corrida desenfreada de dois partidos ao semi-autoritarismo cada vez mais evidente.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Rosa


"....Down and out
It can't be helped but there's a lot of it about.
With, without.
And who'll deny it's what the fighting's all about?

Extrato de letra
The Dark Side Of The Moon

Composição: Pink Floyd

Imagem: Isa Dora

PATRIMÓNIO CULTURAL, IDENTIDADE E MUSEUS EM CABO VERDE

Workshop de tecelagem tradicional caboverdiana, Museu de Arte Tradicional

Abordar o assunto museu conduz-nos a questões estruturais, nomeadamente as políticas culturais do país. Para falar de museologia em geral, há que reportar a dois momentos conceptuais que por sua vez estão sujeitos a influências dos contextos e das dinâmicas sócio-económicas e culturais das nações: O momento da autenticidade e o da representatividade. Abordar o tema dos museus em Cabo Verde convida-nos a observar os percursos que delinearam conceitos do património cultural desde muitos anos antes da independência nacional até a actualidade.

O momento museológico baseado no critério da autenticidade desenvolve-se num contexto em que o mundo passa por uma série de dinâmicas: o acelerar dos sistemas económicos, associados a fenómenos como o desenvolvimento dos meios de comunicação e de transporte de massas; o crescimento das cidades; etc. Essas dinâmicas conduzem a uma nova forma de conceber o tempo e o espaço, instala-se assim um quadro que, segundo autores pós-modernistas, conduz a globalização económica à globalização cultural. Basicamente, dá-se o distanciamento das pessoas em relação seu passado histórico, às suas origens, e às especificidades culturais locais.

Consequentemente, a ausência de referentes de identidade, que no fundo tem a ver com estabilidade e continuidade, face a uma ameaça de desaparecimento de recursos culturais, produz um sentimento de nostalgia em relação ao passado. Daí a procura daquilo que é autêntico, isto é, a valorização da memória, dos locais do passado, desde os monumentos, arquivos, museus e outras formas de patrimonialização. Deste modo, em resposta às pressões da globalização surge a consciência patrimonial.

Nos anos 80 – 90, identificaram-se um conjunto de circunstâncias no contexto social, político e económico que convergiram para a representação do passado como um tempo de ouro perdido.

Ainda dentro da corrente da autenticidade, os processos de patrimonialização envolvem não só a preservação dos vestígios do passado como também a simulação dos seus contextos com o propósito de aumentar o seu potencial de atracção. Assim, um passado a ser observado e experimentado. Em modo ilustrativo, temos aqui em CV, o exemplo dos desfiles de trajes e outros elementos relacionados com festas de romaria, e de Carnaval fora das próprias épocas. E por vezes há a tendência de recriar lugares e experiências cada vez mais distantes do quotidiano das pessoas.

É assim que o património cultural encerra potencialidades para a rentabilização social e económica. Os agentes de turismo em Cabo Verde, de um modo geral, têm se mostrado cientes disso, dado que o turista é cada vez mais um consumidor de cultura.

Entretanto, os critérios de autenticidade, ou de raridade tornaram-se cada vez mais problemáticos, à medida que surgiram novos estudos sobre o conceito de cultura enquanto sistema de significação bem como os conceitos de património cultural e objecto museológico.

O problema é que com a busca do autêntico as pessoas transformaram-se em consumidores passivos de bens culturais, ignorando as múltiplas variáveis que participam nos processos de construção de significados culturais. A necessidade de preencher tal lacuna leva os monumentos e os museus a incluir projectos que reportam também a um passado menos glorioso, ou mesmo oculto, versões alternativas da História, da memória e da cultura. Nasce a tese da representatividade. Neste percurso surgem vários tipos de museus e sítios patrimoniais, os objectos eruditos e os populares passam a receber um mesmo tratamento. Passa-se a valorizar vivências das pessoas comuns, como é o caso dos museus rurais e dos industriais. As próprias exposições em museus passam a dar menos valor ao objecto em si, dando lugar a uma nova forma de comunicar com o público através de novos suportes expositivos bem como slides, outros audiovisuais. Os visitantes são “segmentos de mercado” com diferentes características e necessidades.



A tese da representatividade dá mais ênfase ao património imaterial, valorização das práticas simbólicas e identificação de grupos.

Podemos afirmar que em Cabo Verde, a partir do ano passado, as entidades competentes começaram a socializar estudos relacionados com o património imaterial. Isso demonstra que, o nosso país, paralelamente aos museus com um discurso expositivo centrado no objecto, ou seja, parados na tese ultrapassada da autenticidade, deu-se um passo significativo no desenvolvimento do país face ao tema, isto é, podemos dizer que o país começa a abraçar a tese da representatividade.

O tema de património cultural está estritamente ligado à identidade. Castels (2003) defende que a construção da identidade pressupõe um fim, e há que apurar que fim é esse e que actores estão implicados.

Uma pequena viagem no tempo permite-nos verificar as linhas que moldaram o património cultural cabo-verdiano. É de salientar o papel preponderante dos poderes no processo de valorização do património cultural. Os estudiosos, os escritores e os investigadores têm um papel importante formação da consciência social. Ao evocar os anos 30 vemos escritores, poetas, contistas e cronistas, que se denominavam de claridosos pelo facto de se lançarem na aventura da descrição da realidade cabo-verdiana. Apesar de CV fazer parte do império português, havia uma forte tendência para a marginalização dos crioulos, por isso, o objectivo dos autores, como Jorge Barbosa, Baltazar Lopes, Manuel Lopes, António Aurélio Gonçalves, e outros, era impedir que entre os cabo-verdianos e os portugueses se estabelecesse uma descontinuidade. Longe de ser visto como um complexo do colonizado, Gabriel Fernandes afirma que o trabalho dos claridosos devia ser visto como um passo significativo para a emancipação do cabo-verdiano. Através da literatura, os claridosos divulgaram a mensagem da emancipação e da consciencialização da cabo-verdianidade para o resto do tecido social cabo-verdiano. Esse desabrochar da mente cabo-verdiana continuou a passo galopante até as teses independentistas dos anos 60-70 que tinham como figura intelectual principal Amílcar Cabral.

Nos anos 70, os discursos centravam-se na valorização das raízes, o objectivo era rejeitar tudo aquilo que dizia respeito à cultura europeia. Isso teve um papel importante na consciencialização independentista mas, por outro lado, teve um papel castrador na construção da cabo-verdianidade.

Os intelectuais de outrora delinearam desta forma o entendimento daquilo que é o património cultural cabo-verdiano. Ainda hoje, aquilo que eles escreveram povoam as nossas mentes e determinaram a nossa forma de conceber a nossa própria identidade. Por causa das diferentes teses dos intelectuais de outrora, até hoje realizam-se debates com ideias dispares sobre a identidade cabo-verdiana. Entretanto, com a proliferação de estudos sobre o tema, gradualmente podemos afirmar que o tecido social em geral terá novas opiniões sobre aquilo que constitui o património cultural cabo-verdiano.



Fontes:

CASTELLS, Manuel (2003), O Poder da Identidade volume III, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian.

CHOAY, Françoise (2006), A alegoria do património, Lisboa, Edições 70.

FERNANDES, Gabriel, (2006), Em busca da Nação. Notas para uma reinterpretação do Cabo Verde Crioulo. Florianópolis, Brasil, Editora da UFSC, Praia, Cabo Verde Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro

GOMES DOS ANJOS, José (2002), Intelectuais, Literatura e poder em Cabo Verde. Lutas de definição da Identidade Nacional, Praia, IIPC

HENRRIQUES, Cláudia (2003), Turismo, cidade e cultura, planeamento e gestão sustentável, Lisboa

URRY, John. (1997), Consuming places, Londres, Roudlege




quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Assassinos na estrada


Será preciso carros com atrelados em falésias sinuosas, camiões com contentores escorregadios e chapas voadoras matarem mais pessoas para que se criem normas de segurança relativamente ao transporte de mercadorias?

Esses acidentes que resultam da negligência atiçada pela ganância transformam um simples empresário num puro assassino! Este depois aparece na TV nacional com a mão na cabeça e lágrimas de crocodilo representando um papel no mínimo nojento! Sim porque amanhã ele vai repetir a mesma proeza e fica impune!
Dado que carregar contentores deslizantes é legal e não havendo tempo nem dinheiro para tornar o seu transporte mais seguro, a próxima vítima terá de rezar todos os dias e pedir para seu anjo da guarda arrajar reforços.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

REVOLUÇÃO NOW

Onésimo Silveira em Entrevista no A Semana de 21 de Maio de 2010

"A regionalização administrativa não vai ajudar porque não vai impedir a concentração do poder na Praia e não assegura a distribuição equitativa dos recuros da Nação."



"É preciso que as regiões sejam dotadas de poder de decisão para poderem participar realmente no desenvolvimento do país. Quem está a participar no desenvolvimento do país são os partidos políticos através da Assembleia Nacional , as regiões não. E elas têm que ter um papel dinâmico na solução dos problemas políticos, de desemprego etc"

Alguns factos marcam etapas decisivas na história dos países, mas entrevistas como estas preenchem lacunas abismais sobre o modo de pensar Cabo Verde.

Onésimo Silveira é Doutorado em Ciências Políticas pela Universidade de Uppsala, Suécia, é um dos intelectuais africanos mais conceituados a nível internacional. Foi quadro superior nas Nações Unidas e representante diplomático desta organização em Moçambique, Somália e Angola.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Adeus Vista Vistosa/Bom dia EUROBUILDING

Adeus Vista Vistosa/ Bom dia EUROBUILDING

Ainda faltam mais 9 andares, mais uns dias ao som da maquinaria e dos martelos, que vai até às 10 da noite quando não decidem prolongar a festa até de madrugada...Isso sem falar no holofote que fica apontado directamente para o meu quarto..

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Sequestro na Camara Municipal de São Vicente

Sobre a invasão da Câmara Municipal de São Vicente. É mesmo, aquela instituição de respeito, onde as pessoas trabalham para o bem estar e o progresso do município foi invadida, cercada e fechada durante um dia inteiro. Ninguém podia entrar, ninguém podia sair. Algumas pessoas foram presas, pessoas importantes mesmo, outras foram submetidas a interrogatórios infinitos. Do lado de fora, um aglomerado ligeiramente curioso, mas não havia ninguém a gritar: Soltem-me estou inocente, ou coisa do tipo...
São os bafos do fenómeno que se veste de um nome pomposo: co..rru..p..ção. Em crioulo é: caçu bodi mesmo, parece diminutivo porque termina em di mas o significado igual. Como se trata de uma classe de respeito há que usar uma espécie de suavizante para denominar acções cometidas por aqueles que trabalham em escritórios com ar condicionado, frigobar e carimbos decisores. E hoje ao fim da tarde houve uma manifestação a favor dos caçubodeiros de finas rendas. Sim reclamam por causa do sequestro e pedem justiça. Isso dá que pensar.

Mensagem do cartaz: "A população indignada com o sequestro na Câmara Municipal"

Simbolicamente essa manifestação diz: "Queremos que continuem com os negócios camuflados, não investiguem nada nada nada. Só uma minoria deve prosperar, a minoria que merece prosperar, queremos que continuem a desviar as verbas previamente destinadas para a juventude. Não queremos jovens a praticar desportos como patetas. Queremos sim jovens altivos cheios de grogue e minhocas na cabeça para não questionarem nada. Queremos mais jovens a seguir o exemplo desses pobres injustiçados que foram sequestrados pela polícia"


Façam fóruns, reflictam sobre a violência e a delinquência, isto é, tapem o sol com a peneira!! Clap clap clap... Pois aqui o chão está quente, o povão ruidosamente afirma que não quer saber de "coisas para todos". O que o povão quer é criar uma sociedade de minorias boas e bem estratificadas para poderem continuar um desenvolvimento disforme.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

BIBLIOTECA DIGITAL MUNDIAL DA UNESCO


A BIBLIOTECA DIGITAL MUNDIAL DA UNESCO http://www.wdl.org/

Reúne mapas, textos, fotos, gravações e filmes de todos os tempos e explica em sete idiomas as jóias e relíquias culturais de todas as bibliotecas do planeta.Tem, sobre tudo, carácter patrimonial" , antecipou ontem em LA NACION Abdelaziz Abid, coordenador do projecto impulsionado pela UNESCO e outras 32 instituições.

A BDM não oferecerá documentos correntes, a não ser "com valor de património, que permitirão apreciar e conhecer melhor as culturas do mundo em idiomas diferentes: árabe, chinês, inglês, francês, russo, espanhol e português. Mas há documentos em linha em mais de 50 idiomas".

Entre os documentos mais antigos há alguns códices precolombianos, graças à contribuição do México, e os primeiros mapas da América, desenhados por Diego Gutiérrez para o rei de Espanha em1562", explicou Abid.
Os tesouros incluem o Hyakumanto darani , um documento em japonês publicado no ano 764 e considerado o primeiro texto impresso da história; um relato dos azetecas que constitui a primeira menção do MeninoJesus no Novo Mundo; trabalhos de cientistas árabes desvelando o mistério da álgebra; ossos utilizados como oráculos e esteiras chinesas; a Bíblia de Gutenberg; antigas fotos latino-americanas da Biblioteca Nacional do Brasil e a célebre Bíblia do Diabo, do século XIII, da Biblioteca Nacional da Suécia.

Fácil de navegar !Cada jóia da cultura universal aparece acompanhada de uma breve explicação do seu conteúdo e seu significado. Os documentos foram escaneados e incorporados no seu idioma original, mas as explicações aparecem em sete línguas, entre elas o Português.

A biblioteca começa com 1200 documentos, mas foi pensada para receber um número ilimitado de textos, gravados, mapas, fotografias e ilustrações. Como se acessa ao sítio global Embora seja apresentado oficialmente hoje na sede da UNESCO , em Paris, a Biblioteca Digital Mundial já está disponível na Internet, através do sítio www.wdl.org .

O acesso é gratuito e os usuários podem ingressar directamente pela Web , sem necessidade dese registarem.
Permite ao internauta orientar a sua busca por épocas, zonas geográficas, tipo de documento e instituição. O sistema propõe as explicações em sete idiomas (árabe, chinês, inglês, francês, russo, espanhol e português).

Os documentos, por sua parte, foram escaneados na sua língua original. Desse modo, é possível, por exemplo, estudar em detalhe o Evangelho de São Mateus traduzido em aleutiano pelo missionário russo Ioann Veniamiov, em 1840. Com um simples clique, podem-se passar as páginas de um livro, aproximar ou afastar os textos e movê-los em todos os sentidos.

A excelente definição das imagens permite uma leitura cómoda e minuciosa. Entre as jóias que contem no momento a BDM está a Declaração de Independência dos Estados Unidos, assim como as Constituições de numerosos países; um texto japonês do século XVI considerado a primeira impressão da história; o jornal de um estudioso veneziano que acompanhou Fernão de Magalhães na sua viagem ao redor do mundo;o original das "Fábulas" de Lafontaine, o primeiro livro publicado nas Filipinas em espanhol e tagalog, a Bíblia de Gutemberg, e umas pinturas rupestres africanas que datam de 8.000 A.C..

Duas regiões do mundo estão particularmente bem representadas: América Latina e Médio Oriente. Isso deve-se à activaparticipação da Biblioteca Nacional do Brasil, a biblioteca Alexandrina do Egipto e a Universidade Rei Abdulá da Arábia Saudita.

A estrutura da BDM foi decalcada do projecto de digitalização da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, que começou em 1991 e actualmente contém 11 milhões de documentos em linha. Os seus responsáveis afirmam que a BDM está sobretudo destinada a investigadores, professores e alunos.

Mas a importância que reveste esse sítio vai muito além da incitação ao estudo das novas gerações que vivem num mundo áudio-visual. Este projecto tampouco é um simples compêndio de história em linha: é a possibilidade de aceder, intimamente e sem limite de tempo, ao exemplar sem preço, inabordável, único, que cada um alguma vez sonhou conhecer.

Alejandro del Teso Herradón
Bibliotecário

quinta-feira, 1 de abril de 2010

MAIS ALÉM

Mais além

A leste das montanhas da nação Cherokee

um índio na motocicleta cruza o deserto

ao longe o cemitério onde dorme o pai,

mas ele sabe que seu pai não está ali,

É mais além

(Mais além)

A linha que separa o mar do céu de chumbo

A gaivota caça o peixe radioativo

O náufrago retém a última miragem

e morre como se continuasse vivo

É mais, é mais além

(Mais além)

Um pouco de exagero, não é nada demais

um olho nas estrelas, outro olho aqui

O astrônomo lunático brincando com o sol

descobre que a distância é mais do que um cálculo

É mais, é mais, é mais além

(Mais além)

A lua metafísica na poça de lama,

ponteiros que disparam ao contrário das horas

Hora de saber o que mudou em você,

que olha no espelho e não vê ninguém

É mais, é mais, é mais, é mais além

(Mais além)

O homem sobre a areia como era no início

roçando duas pedras, uma em cada mão

descobre a fagulha que incendeia o paraíso

e imaginou que havia inventado Deus

É mais, é mais, é mais, é mais, é mais além

(Mais além)

Letra de Ney Matogrosso
Na imagem: Ney Matogrosso

segunda-feira, 22 de março de 2010

Partidos A e B

Homo homini lupus est
O homem é lobo para o homem
Versão cabo-verdiana


Viver em Cabo Verde significa ser de um dos partidos A ou B. Se decides pintar um quadro és sem dúvida do lado A; os do lado B reconhecem-se pelos penteados... Está tudo em compartimentos de dois. Assim ninguém se engana...
Cada um tem o seu gosto e todos são felizes por escolherem o seu lado como quem tem preferência por um determinado lado de uma cassete. E tudo está bem, quando acaba bem.

Mas como é que algo pode estar bem quando o fanatismo dita a forma de estar de um povo. Como diz Kertész, "o fanatismo dessemina o ódio, ninguém se salva nesta batalha que só tem perdedores."
O discurso do ódio em Cabo Verde a passo galopante, as palavras de ilustres e de ilustríssimos sobre assuntos aparentemente banais são automaticamente convertidos em fanatismo. E o ódio vai tomando conta de todo o tecido social...No trabalho, na rua, na Tv, no supermercado, na rádio, na discoteca, nos blogs, nos jornais on line...
Agora estão todos à espera de uma intervenção divina, ou uma espécie de raio laser para travar a violência nas ruas.

"O elelmento que as pessoas estão dispostas a repudiar é o amor e a necessidade de ser amado... Prefere-se conceber o ser humano como uma criatura cujo institinto predominante é a agressividade. Assim o próximo é não apenas um potencial ajudante, ou um objecto sexual, mas também alguém sobre o qual se pode satisfazer a necessidade de agresssividade, explorar a sua capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo sexualmente sem o seu consentimento, apoderear-se de suas posses, humilhá-lo, causar-lhe sofrimento, torturá-lo e matá-lo - Homo Homini lupus est" O mal-estar da civilização, de Sigmund Freud



Ser das ilhas de Cabo Verde



A cabo-verdianidade contém no seu âmago conceptual contextos da História cabo-verdiana que começam com a descoberta e o povoamento das ilhas. Partindo duma hipótese analítica baseada no marxismo, podemos resumir que a construção conceptual da cabo-verdianidade é sustentada por três fases basilares: 1ª Fase: A dominação colonial; 2ª fase: O questionamento ou o processo de emancipação (que começa com os pré-claridosos, passando pelos claridosos e finalmente as teses independentistas); 3ª fase: A Independência e a vida pós independência. Enquanto que o senso comum diz que o sistema colonial acabou e está enterrado, a História e a Antropologia Social e Cultural afirmam que ele está presente em cada gesto do cabo-verdiano do tempo presente.
Propomos um roteiro documentário que pode espelhar uma infinitésima parte daquilo que é ser cabo-verdiano e viver nas ilhas de Cabo Verde.
Cenário 1: ano 2010 Hora de ponta, meio-dia e meia ou sete horas da tarde, é a dança urbana dos uniformes escolares: Fardas de várias cores: castanho, a azul claro, azul-escuro, verde e cinzento, cada cor uma escola secundária. Um desfile colorido com vida própria, que se repete em todas as gerações. Cada aluno com o destino traçado à partida pelo contexto e pelas decisões ou atitudes do presente. Uns passam a passo lento, outros quase a correr, uns a conversar, outros saboreando as iguarias das vendedeiras de balaio. Por vezes, entre montes de palavras soltas, ouve-se um comentário: “O professor fulano de tal ê um bom diab d inferr!” E pensamos ora com orgulho, ora apreensivos: «Esses meninos são o futuro desta terra…»
Cenário 2: Finais dos anos 70, anos 80, os primeiros anos da tomada da independência, tempo de glória e de afirmação de uma nação independente. É a altura da valorização dos cursos superiores. Legítimo, pois; durante a fase imediatamente após a independência o objectivo era munir o país de quadros superiores. O problema é que a moda do «curso» chegou e instalou-se por mais de trinta anos, de tal maneira que tomou conta das camadas subcutâneas do ADN cabo-verdiano, levando ao surgimento da cultura da sobrevalorização dos cursos superiores no país.
Cenário 3: Hoje em dia há quem abomine a designação “doutor” e chega mesmo a afirmar que em termos de quadros, o país é uma espécie de recipiente cheio de pseudos e uma fina película na borda dos que são realmente doutores, melhor dizendo, os reconhecidos ou pelo poder ou internacionalmente. Mas como chegámos a tal ponto? É que o termo doutor já passou por várias fases: inicialmente, quem tinha o grau de licenciado era com respeito designado por doutor, posteriormente essa designação passou a uma palavra corriqueira do quotidiano, e actualmente é utilizado como termo pejorativo por muito boa gente.
Cenário 4: Ultimamente, fala-se em cursos técnico-profissionais, mas para este novo paradigma é preciso investir no marketing de consciencialização da importância desse sector de ensino. Porque alguns completam o secundário da Escola Industrial e Comercial com conhecimentos de electricidade, oficina, etc e o sonho legítimo de cursar não permite a aplicação efectiva de tais conhecimentos. Outros seguem a via técnica como profissão, são bem sucedidos e, como sempre, uma minoria evolui para as empresas importantes do mercado. O ponto fraco dessa minoria é que muitas vezes seguem o mesmo modelo de monopólio típico das grandes empresas. Esses monopólios têm as seguintes características comuns: o cliente larga os seus afazeres diários, para ficar à espera durante um ou dois dias, numa fila tentando fazer um contrato e é recebido pela divindade «Atendimento» que apresenta um chicote em vez de simpatia e agilidade. Para os clientes reivindicativos, que reclamam os seus direitos, existe sempre um formulário mágico para cada tipo de reclamação. O resultado é que ele vai para casa baralhado, com uma explicação super técnica e, de tão cansado de esperar, decide embarcar no esquema. Estas são das estratégias mais conhecidas dos monopólios em Cabo Verde; trata-se duma herança colonial sobreaproveitada pela mente capitalista cabo-verdiana, um autêntico paraíso para os investidores externos. Perguntamos: como fica o desenvolvimento de um país em crescimento no meio desta salada?


segunda-feira, 15 de março de 2010

CONVITE

Caros e estimados.
Venho por este meio solicitar que me ajudem a divulgar este ideia/projecto em fase de concretização num apelo ao espírito aventureiro de todos aqueles se sentindo-se capazes e tendo disponibilidade e força de vontade, caboverdeanos ou não, se predisponham a investir 30 dias das suas vidas neste desafio onde o deserto é apenas uma ponte. Obrigado antecipadamente.
Marco Além
marcoalem@gmail.com
Procuro alma(s) aventureira(s) (m/f) para uma viagem entre Lisboa/Dakar ou Bissau em bicicleta de aproximadamente 3.000 km (até Dakar). A ideia é percorrer entre pedais e tendas países como Portugal, Espanha, Marrocos, Sahara Ocidental Mauritânia, Senegal e, possivelmente Gâmbia e Guiné Bissau. A viagem deverá ser feita a uma média de 100 km dia durante 30 dias.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Quando o chão acaba

Testemunho de uma vítima de violência doméstica
A história de Samara


O meu ex. companheiro tem problemas de adicção de álcool e crack. No início não sabia que ele tinha esses problemas, vivíamos juntos, era tudo um mar de rosas. Ele era um moço muito bonito e criativo, inteligente… Comecei a notar um comportamento suspeito, por vezes ele mostrava-se muito contente, abraçava-me no meio da rua, fazia declarações de amor em público.. Outras vezes ficava com um ar longe e desligado. As declarações de amor começaram a ficar mais escassas. Passou a ausentar-se muito, não voltava para casa depois do trabalho e quando voltava dizia que estava a tratar os seus assuntos. Comecei a pensar que ele tinha outra pessoa. Até que um dia descobri um cachimbo feito manualmente no meio de umas roupas!! Fiquei apavorada, pois sabia que aquilo era muito mau sinal. Um dia ele chegou do trabalho e convidou-me para um passeio…Quando dei por mim estava num apartamento e um dealer de pedra. Levou-me com ele de madrugada para ir comprar uma coisa muito importante para descontrair-se porque o trabalho dele estava um stress, dizia. Consumia as pedras à minha frente e contava-me histórias, eu escutava petrificada e muito triste, chegou a perguntar-me se era servida…. Imagina, eu tinha ouvido falar da pedra e aquilo parecia-me um fim do mundo. Afinal aquela história maravilhosa que estava vivendo era um castelo de cartas. O mundo desabou.



Quando ele estava sob o efeito do crack vinha a paranóia de que o eu traía, não podia falar com nenhum homem nem ficar muito íntima com amigas, quando era sob o efeito do álcool ele tornava-se violento mesmo… Apresentei queixa contra ele, por agressão física… (ainda me lembro das caras de riso contido dos polícias e dos comentários “quando forem para casa vão entender-se”). Isso acontece frequentemente com algumas vizinhas minhas e amigas que vivem nessa situação por falta escolha, porque na maior parte das vezes, quem ganha mais são os homens delas, e elas trabalham a cuidar dos filhos, da casa, lavando roupas em outras casas…
Se neste momento estou livre das loucuras do meu ex. companheiro, não é pela acção da justiça, o consumo do crack levou-o a cometer vários crimes de roubo e, para fugir às consequências judiciais, ele decidiu passar uns tempos noutra ilha, aos poucos deixei de atender os telefonemas dele, arranjei outro companheiro e foi assim que me livrei dele.

Olha, um copinho de grogue custa 20$00, uma pedra de crack custa 200$00, às vezes pode ser mais caro ou mais barato, o acesso a esses produtos é cada vez mais fácil. Estão até nas portas das escolas, cada dia há mais meninos nessa situação e são cada vez mais novos. Quando vão para a escola as famílias já problemáticas ficam aliviadas por terem mais um para a escola cuidar. Mas na escola são tantos dentro de uma turma, mais de trinta para um só professor, por isso, passam despercebidos, cedo descobrem que estão por sua conta.

terça-feira, 2 de março de 2010

ALGUÉM AVISOU AS RABIDANTES?

Primeiros meses de 2010...

Este mar que nos liga e isola do mundo e que definitivamente nos separa uns dos outros não é nada face à unidade que sentimos agora em relação às mudanças climáticas. Credo! Tivemos um Carnaval mesmo calorento! Quem trajou as vestimentas menos pudicas, não sentiu o ventinho fresco e incomodativo (com todo o respeito à mãe Natureza) dos anos anteriores. Enfim!!! Funciona como que um descontrolo de fuso horário, a temperatura nos relembra o Verão. Mas é um Verão que sabe a artificial, sem o cheiro a mangas de terra, sem as caras novas típicas das férias. Um Verão em que os meninos ainda usam as fardas escolares...


Os meteorologistas responsáveis não avisaram às rabidantes que não era preciso trazerem casacos de peles sintéticas. Que mais não avisaram?


Agora sim, o medo começa a instalar-se mesmo. Hoje em dia , os pensamentos estapafúrdios e absurdos das noites de insónias voluntárias ou involuntárias, passíveis de ocorrer a um cabo-verdiano, incluem também solucionar mentalmente o problema: tsunami em Cabo Verde, que tipo de abrigos construir? Se as ondas tiverem mais de duzentos metros não é preciso pensar em soluções, ficaremos reduzidos ao que sempre fomos (dos restos da Atlântida perdida), numa versão mais molhada .


Mas se as ondas forem menos de duzentos metros, teremos de pensar em construção de abrigos, e se a insónia for daquelas ferradas, o pensamento vai mais longe, já estaremos a resolver problemas geológicos e matemáticos inventando inclusive fórmulas inéditas sobre como sobreviver aos desabamentos, aos esgotos a céu aberto, e por aí adiante...

As nossas tropas serão suficientes? Com a unidade climática, em vez de ajuda externa passaremos a ter ajuda interna. Ela chegará a todas as vítimas das mudanças climáticas mundiais?

sábado, 20 de fevereiro de 2010

O CRIME E O CASTIGO

Excerto do poema "O crime e o castigo"
Autor: Khalil Gibran
...


Como o Sol é o vosso eu-divino.
Não conhece os buracos da toupeira, nem as tocas da serpente.
Mas o vosso eu-divino não habita apenas o vosso ser.

Ainda é humano muito do que há em vós,
e muito do que há em vós ainda não é humano,
mas antes um pigmeu informe que caminha adormecido no nevoeiro
em busca do seu próprio despertar.

Agora gostaria de falar do homem que há em vós.
Porque não é o vosso eu-divino,
nem o pigmeu do nevoeiro, que conhecem o crime
e o castigo do crime.

Amíude, vos tenho ouvido falar de alguém que comete um delito
como se não fosse um de nós
mas um estrangeiro e um intruso no vosso mundo.
Ora eu digo-vos que assim como nem o santo
nem o justo se podem elevar
acima do mais alto que mora em cada um de vós,
também o malvado e o débil não podem cair
mais baixo que o mais baixo que mora em cada um de vós.

E assim como nem uma só folha se torna amarela
sem o silencioso consentimento de toda a árvore,
Assim o malfeitor não pode fazer mal
sem o oculto assentimento de todos vós.
Como em procissão caminhais juntos para o vosso eu-divino.
Vós sois o caminho e sois os caminhantes.

E quando um de vós tropeça e cai,
fá-lo para precaver os que vêm atrás dele
como advertência contra a pedra do tropeço.
Sim; ele cai por aqueles que vão adiante.
e que embora ágeis e de pé seguro, não afastaram a pedra do tropeço.

E ficai sabendo, ainda que as palavras caiam pesadas nos vossos corações;
O assassinado não é irresponsável pelo seu próprio assassinato;
E o roubado não está livre dos actos do malvado,
e aquele que não tem mancha
não está limpo das acções do réu.

Mais ainda; o culpado é muitas vezes a vítima do ofendido.
E, ainda com mais frequência, o condenado é que leva a carga
em vez do irrepreensível e inocente.

Não podeis separar
o justo do injusto e o bom do mau.
Porque estão juntos à face do Sol,
como são tecidos juntos
o fio negro e o branco.

E quando o fio negro se quebra;
o tecelão examinará toda a teia e todo o tear.
Se um de vós julga a esposa infiel,
Ponha na balança o coração do marido
E meça a sua alma com cuidado.

E aquele que quiser açoitar o ofensor
olhe bem, antes, o espírito do ofendido.
E se um de vós quiser castigar em nome da rectidão
e descarregar o machado contra a árvore do mal, olhe bem antes as suas raízes.

E, por certo, encontrará as raízes do bem e do mal,
do frutuoso e do estéril,
entrelaçadas no coração silencioso da terra.
E vós, juíses que quereis ser justos
Que sentença pronunciareis contra aquele que,
embora seja honesto segundo a carne,
É ladrão segundo o espírito?

Que pena aplicareis
àquele que assassina segundo a carne,
e é ele próprio assassinado em espírito?
E como julgareis, aquele que nas suas orações
é um impostor e um tirano
mas também ofendido e ultrajado?

E como processareis aqueles cujos remorsos
são já maiores que os seus delitos?
Não é remorso a justiça administrada
por essa mesma lei que tão bem quereis servir?

Contudo, não podereis impor remorso ao inocente,
nem arrancá-lo do coração do culpado.
Espontaneamente gritará de noite
para que os homens vigiem e pensem.

E vós que sois chamados a compreender a justiça,
como podereis fazê-lo a não ser examinando
todas as questões à plena luz do dia?

Só então sabereis que o justo e o caído
são apenas o mesmo homem de pé no crepúsculo
entre a noite do seu eu-pigmeu, e o dia do seu eu divino.
E que a pedra angular do templo
não é superior à pedra mais funda dos alicerces




Khalil Gibran

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

AVISO


Aviso


Não nos venham dizer depois

que não avisámos!


Podem brandir o chicote

e arreganhar os dentes

e espumar pela boca


(são serviçais...)



Podem metê-los em prisões

cadeias nos pulsos

correntes nos pés


(são serviçais...)


Podem humilhá-los

mil vezes massacrá-los

matá-los de mil mortes


(são serviçais...)


Mas depois

não nos venham dizer

que não vos avisámos
Ovídio Martins, 1962


Poetas de poucos anos atrás descreviam assim a nossa terra...
Tão viscerais as suas descrições e... agora... tão tabus as constatações!
Tão camuflados esses sentimentos !
Agora...dissmulados dentes serrados
E subtis os ecos, as reproduções...

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

4ª Revolução Industrial




Enquanto aves adormecem o voo
Os sons despontam de longe nítidos
Escorregando pelas sombras frescas
Pelas esquinas de luz fugidia
Sombras que não passam de sombras sem dono
Umas esguias outras planas, infinitas
Cânticos que trazem as brisas do deserto
Que atravessam séculos
Odores de vidas agitadas
Vagueiam por ruas
E avenidas que são leitos secos de rios cantantes
Entre margens entre mundos
Entre reviravoltas e ciclos imprevistos
Seres velozes, distraídos dançam se entregam
A novos acordes
E se alimentam apenas de sonhos



segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Temos de tudo

TEMOS:
Aeroporto internacional sem condições para receber voos internacionais nocturnos;
Universidades sem bibliotecas;
Instituições culturais sem autonomia;
Projectos de restauro milionários;
Projectos de reutilização de edifcios restaurados sem estudo de viabilidade;
Instituições de comunicação social desligadas da comunidade;
Seminários sobre património cultural para profissionais de todo país, como sinal de "descentralização";
Cadeia civil sobrelotada;
Burocracia dependente;
Cinemas extintos;
Centro Nacional de Artesanato extinto;
Hospital sem reagentes para detectar a dengue;
Marina aberta para o que der e vier;
Escolas secundárias sem laboratórios;
Escolas secundárias sem espaço para a prática de educação física;
Gangs organizados;
Professores univesitários que leccionam cadeiras de outras áreas de competência;
Clientes exlusivos para compra de terrenos;
.... (tudo isso e muito mais na paradisíaca ilha de São Vicente)

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Twin Peaks


Twin Peaks é uma série do princípio dos anos 90, criado por David Lynch e Mark Frost, produzida por Aaron Spelling, que conta a história passada numa cidade aparentemente pacata dos Estados Unidos. A trama principal gira em torno da adolescente Laura Palmer, orgulho da cidade, que aparece morta às margens de um rio, enrolada num saco plástico, logo no começo do primeiro episódio. Esse misterioso assassinato vem revelar o lado obscuro duma cidade que ocultava grandes segredos de raízes profundas e bem emaranhadas. Traições, mentiras, ciúmes e paixões escondidas explicam esses segredos, mas eles podem incluir revelações sexuais, drogas e perversões.


A série conquista os fãs do género pela atmosfera surrealista, pela constante confusão entre o sonho e a realidade. O suspense hipnótico é também desenhado pelo carácter perverso de certos personagens como por exemplo o anão que fala de trás para frente que aparece nos sonhos do agente Dale Cooper, este que é um excêntrico agente do FBI encarregado de investigar o assassinato; a Log Lady, uma senhora que anda sempre com um tronco ao colo e diz que ele sabe o que se passou na noite em que a Laura Palmer morreu; o One-Armed Man, que está relacionado com Bob, uma entidade sobrenatural que está relacionada com o crime. A banda sonora está a cargo de Angelo Badalamenti que em resumo demosntra uma mistura entre a frescura da adolescência e a sensação de impotência face aos infortúnios e a volatilidade da vida.


Fonte: Wikipedia





O futuro acontece


Excertos de diário de campo (St Luzia, Janeiro de 2911)
"...Quando uma estudante do ensino secundário aparece grávida a meio do ano lectivo, é convidada deixar de frequentar as aulas para não dar mau exemplo às colegas. Assim troca-se os livros por fraldas. Quando um grupo rapazes estudantes do ensino secundário leva a guerra de gangs para dentro da escola, alguns colegas passam a opinar que a escola afinal já não é segura e outros colegas aderem ao grupo dos arruaceiros. Assim as mochilas passam a levar armas e livros..."

Disciplina de Etnografia Caboverdiana (EC)

Trabalho sobre o comportamento juvenil nas escolas secundárias das aglomerações urbanas de CV

Universidade das Ilhas em Geral (UIG)